29 de out. de 2012

instantes

quanto de nós está depositado, contido, preso num piscar de olhos que a gente expressa numa gentileza? naquele instante no qual se quer dizer um okay mais rápido, como se o okay já não fosse por si mesmo uma pressa?

não sei não, mas há dias que tenho acordado desconfiada de que a vida inteira, com seus cem anos de sorte e velhice para que tem sorte e velhice, está toda reunida num instante...

naquele ensejo que ele deixou para que eu pedisse para ele me esperar.

naquela chance de prolongar o silêncio quando eu, boba, boba, boba, tagarelei rotinas na tentativa de boba, boba, boba, esconder o meu desejo de me calar e de ficar olhando, assim, pra ele em silêncio.

ou naquele momento que eu fiz quietude, quando o que eu deveria mesmo era ter vivido de palavras e ter dito logo para ele que o que queria mesmo era que ele não dissesse nada e chegasse mais perto, assim, de mim.

a vida nos instantes que me divido entre arrumar o cabelo e ir ensaiando até a porta como falar "Oi, tudo bem?" sem deixar assim, tão claro, que estou muito melhor agora que ele tocou a campainha.

a vida inteira num pedaço de torta de chocolate, numa corrida de tirar o fôlego. naquele instante em que prenuncia o frio na barriga na montanha russa, que foi na verdade o motivo da gente ter passado quase uma vida na fila do parque de diversões.

e naquele sorriso de canto e inesperado, que a gente tem quando uma criança chama puxando devagar a barra do nosso vestido... instantes em que a vida toda é por si só um instante e nos quais somos justamente aquilo que sempre seremos mesmo daqui cem anos, sabe?


25 de out. de 2012

trabalho é o amor tornado visível

o primeiro paciente a gente nunca esquece...véspera foi ansiosa. abri a porta, chamei o seu João. se levantaram um casal, de mãos dadas vieram até mim. o seu João, um senhorzinho simpático, pequeno, olhos azuis, do seu lado Loreni, uma senhora morena, forte. conduzi até a cadeira e ficamos numa prosa longa. – Nossa, me passei no tempo, pensei comigo. super atrasada, começo a preparar os materiais para o exame. e aquela ansiedade se transformou em prazer. foi uma felicidade que veio de dentro.

passaram-se os meses. chegou a hora de desperdi-se do seu João e da dona Loreni. aquele senhor de olhos bonitos mas que antes não podia sorrir, chorou. olhou nos meus olhos, e me deu um abraço.
e, naquele dia, senti uma coisa que palavras não traduzem.

o seu João foi o primeiro. ele era um desconhecido que estava com os pés suspensos e a boca aberta (literalmente). inseguro, no início olhava-me com dor, quase pedindo colo.

quão simples foram os nossos momentos, de trocas. como eu aprendi com aquele casal, que nutria um amor de 54 anos.

no fim, ele fez parte da minha história, e me deixou pela primeira vez a emoção em sentir que nas minhas mãos há a arte de modificar a vida dos outros através de simples, mas sinceros sorrisos...

eu, uma menina de 16 anos, senti o gosto do acerto. sim, acertei! farei isso pelo resto dos meus dias e será sublime.ninguém me disse, mas eu desde aquele dia, sabia.

os anos passaram, muitos pacientes vieram, muitas histórias, e muitos sorrisos. e sério, que delícia trabalhar com sorrisos. que delícia espalhar sorrisos mundo afora e levantar auto-estimas.

hoje só tenho a agradecer, por tudo e todos que passaram. tenho orgulho do que faço, e quero continuar fazendo até quando e onde Deus assim o permitir.


10 de out. de 2012

um lugar que virou paixão

e sobre a cidade da rainha?

Londres é um lugar mágico, daqueles que fazem seus olhos brilharem para qualquer direção que você olhe.

não é uma cidade poética como Paris, mas aquele céu cinza, a arquitetura recheada de requintes e detalhes góticos combinados a melancolia e aquele corre-corre de uma grande metrópole faz com que a cada piscar de olhos você se apaixone mais por aquele lugar.

essa viagem foi capaz de encher de ar os pulmões da minha alma. mais do que conectado via suas famosas cabines vermelhas de telefone, ou agradado pela cordialidade de seu povo, quem vai à Londres tem uma experiência inesquecível.

é uma cidade tão linda que chega a ser fotogênica -as fotos não deixam mentir.

um pedaço do meu coração ficou por lá, e tenham certeza que em um dia eu ainda volto para buscá-lo - ou quem sabe, deixo ele por lá mesmo?



então Ju me conta como foi o teu recital de piano, ficou muito nervosa?

“Aí eu tava no palco e sentia-me apavorada. Olhei para todas as pessoas que estavam a olhar para mim, foi então que reparei no meu pai que estava a acenar-me e a sorrir. Era a única pessoa a fazer aquilo. O medo desapareceu.”

Júlia,  paciente de 8 anos

2 de out. de 2012

O Retorno do Jovem Príncipe



"O Retorno do Jovem Príncipe". A.G.Roemmers, consegui enxergar através de suas palavras como o pequeno príncipe conseguia enxergar um carneiro através da caixa.

e ao fim dessa leitura linda, que me fez chorar trilhões, vi que meus olhos ainda conservam o deslumbramento de quando eu tinha 12 anos e li o pequeno príncipe pela primeira vez.

"Você deve perdoar o fato de que a primeira reação das pessoas é julgar alguém pelo seu aspecto externo."

...tão feliz... tão grata a A. S. Exupéry e, agora, também a A. G. Roemmers por me darem forças para preservar minha inocência e pureza de coração...este livro me fez lembrar de tudo o que não convém esquecer.