11 de mar. de 2014

em frente aos fogões a lenha, as antigas amanheciam antes do sol e talvez se deitassem antes de estarem cansadas para o outro dia. o que havia naqueles temperos do passado e nas manhãs em que os galos é que despertavam só podia ser um mistério das coisas inacabadas. nos mercados em que iam não se achava nada pronto. eram os ovos, eram farinhas e mais o que precisavam cheirados com os dedos, olhares e narinas. como se as antigas estivessem a procurar uma concha integra de caramujos vivos numa praia de conchas pisadas. voltavam ao lar e amanheciam no dia seguinte. estavam dispostas a passarem o pré-almoço fazendo a refeição da família com um amor que não tem pressa para gulodices. o vinho que se punha à mesa havia sido preparado há muitos anos e naqueles dias tinham elas o prazer de colher os verdadeiros frutos da uva. estavam no tempo certo no qual as coisas nunca estavam prontas e careciam delas para o preparo e, consequentemente, para o seu sabor.

nos dias de hoje, a mais linda das antigas que eu tive a graça divina de conviver, a dona Eva, me diria que o mau do mundo são as coisas prontas. são esses pacotes que se vendem no mercado e que podem se comprar muito depois de se apagar a luz do sol. aquelas mulheres diriam que, na verdade, não estamos prontos para o passado e ansiamos com muita pressa e desgraça o sabor do futuro.

e desse mundo que nos dá temperos prontos e rápidos elas lamentariam, com certeza.

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